K-Lear
Caracterização das personagens
Neste filme, pode dizer-se que um só actor – em carne e osso – faz todas as personagens, embora isso não seja inteiramente verdade uma vez que outras personagens se cruzarão com ele, quase sempre em voz off.
Apesar disso, tudo se constrói à roda dele, e na sua imaginação.
E já agora, vamos baptizá-lo William, como Shakespeare.
William é um actor de meia idade. Deveria estar a meio de uma bela carreira mas parece ter chegado ao fim. No entanto teve a possibilidade de interpretar importantes papéis em grandes produções de teatro inclusive de circulação internacional. Foi até estrela de cinema, aclamado pelo público e pela crítica. Casou. Teve um filho. Há 3 anos que não encontra trabalho.
Tem de lutar para não desesperar. Os castings sucedem-se. Mas os papéis nunca lhe saem. O seu agente desinteressa-se do seu caso. Sozinho passa dias e dias a deambular pela casa. A sua mulher é o seu único apoio. E no entanto ele sabe o que vale, preparou-se anos e anos e conseguiu distinguir-se dos outros. Para obter trabalho tentou tudo, da simpatia à agressividade. Deixa-se ganhar pela amargura. Mas não deixa de se exercitar : “the readiness is all” (Hamlet. Act v. Sc. 2.) Antigos papeis vêm-lhe constantemente à cabeça e também exercícios de escola. Uma peça, em particular começa a “habitá-lo” : King Lear de Shakespeare. Lê-a e relê-a. Pouco a pouco parece colar-se à sua pele. Em tempos fez o papel de Edmund, o bastardo. Teria preferido Edgar, o legítimo...
Como sempre fez quando aprendia um papel, aprende desta vez todos os papeis. Sente-se estranhamento “em casa” dentro desta peça. Não terá sido ele próprio o responsável pelo seu afastamento dos placos? Tal Lear que renunciou ao seu reino? Ou como Cordelia foi sincero demais? Ou como Glocester demasiado leal, ou demasiado cego? Será que foi o seu agente que – como Edmund – o traiu? Ou rivais que, como Regan ou Goneril, intrigaram contra ele? Porquê esse sentimento de impotência, como Lear no meio da tempestade, e essa pequena voz interior, que tal o Bobo, o faz temer estar a perder a cabeça? Pouco a pouco, através de diferentes excertos da peça as diferentes personagens revivem através das suas próprias experiências e o seu quotidiano parece agora fundir-se com a peça de Shakespeare.
Ao longo do filme, ficaremos surpreendidos de ver a que ponto a linguagem poética de Shakespeare toca ao universal. A palavra final do filme deixar-nos-à certamente que pensar: quando ao fim do dia a sua mulher regressa a casa, à pergunta banal “Olá querido, o que fizeste hoje?”, “Nada”, responde, “Nada”,
Outros personagens:
A sua mulher : Joana
O seu filho : Luís
Personagens secundárias:
Homens de negócio num restaurante
Homem do banco
Mulher aflita
Policia
Serralheiro
Desempregado pedinte
Músicos
Homem que salta a barreira do metro
Vendedores clandestinos....
Personagens em off :
Rei Lear
Goneril
Regan
Cordelia
Glocester
Kent
Edmund
Edgar
Duque de Albânia
Duque de Cornualha
Rei de França
Bobo
Oswald